terça-feira, março 11, 2008

Como outros, este texto e respectiva tomada de posição, chegou ao meu mail.
Por considerar que é um documento inteligente e que dignifica a profissão, profissão que, até à data tenho considerado das mais democratizantes, deixo aqui a minha colaboração na divulgação do conteúdo do texto...pois sempre acreditei que qualquer reforma ou alteração ao sistema, de ensino (ou outro), começa e continua com a mudança na capacidade criativa, dinâmica e prática dignificante de cada um dos professores que integram as escolas. Para isso é necessária a coragem demonstrada pelos professores e professoras aqui envolvidos numa reacção inteligente, consistente e sensata que em muito pode contribuir para uma reflexão cuidada das alterações que estão a ser colocadas às Escolas...
Afinal, as Escolas são os Professores, os Funcionários, os Alunos e os Pais, são as pessoas! E nenhuma alteração se pode fazer sem uma prática (individual e/ou colectiva) consciente e consistente destas pessoas.
Efectivamente a avaliação proposta é discriminatória, começando desde logo pelo concurso a professor Titular que inquinou toda e qualquer sugestão plausível para uma avaliação fiável:
  1. O Concurso que determina quem coordena e quem avalia eliminava à partida, professores e professoras com percursos paralelos (percursos esses associados à administração e gestão escolar, ensino superior, projectos educativos alternativos);
  2. O sistema de avaliação com atribuição de "Excelente", impossibilita dois professores ou professoras de obterem esta classificação (apenas um pode ter Excelente), embora se queira promover Escolas de Sucesso! (mas só com um professor excelente). Promovendo a competitividade e discriminação entre pares, inclusivé o avaliador;
  3. Professores e professoras com faltas não poderão ser professores Excelentes - exclui-se à partida a atribuição a professoras por motivos de parto ou assistência à familia (este parece-me o ponto mais indigno de toda a legislação!)

Professores Excelentes não ficam doentes, nem vão a funerais, nem acompanham a familia, nem participam em actividades de formação e qualificação profissional como congressos e seminários da sua área vocacional (o que diminuirá em larga escala a participação activa nas conferências que aqui tenho vindo a publicar e que contribuiram em muito para a minha formação pessoal, pedagógica, investigativa - este é outro ponto que me parece indigno da nova legislação, além de contraditório, pois na avaliação de desempenho proposta, a participação em actividades cívicas e comunitárias é um dado importante)

Só + uma nota que me parece importante:

Para se ser consistente com a reacção dos professores, como podem as Escolas e professores que se manifestam (e muito bem! Creio que é um contributo positivo para a reforma do sistema Educativo - nunca vi tantos professores a manifestarem-se, inclusivé os mais insuspeitos) e os que não se manifestam, contrubuir com os quadros de "Excelência" das Escolas, colocando os alunos numa bandeja da "Excelência"??? Quando perceberão que a palavra "excelência" é incopativel com qualidade e sucesso e respeito e dignidade para todos?!

Falta ainda referir que a profissão de professor não termina nem começa no horário estipulado: Nenhum professor coloca como horas extraordinárias os tempos não lectivos que dedica em reuniões cada vez mais extensas, na preparação de documentos, na correcção de materiais curriculares e escolares dos seus alunos, na actualização sistemática da sua profissão, na realização, leitura, reflexão, análise de toda a documentação burocrática que inundou a profissão, tornando-a quase doentia (ex: depois de terminar de corrigir os testes às 02:00 h a.m. uma professora inicia o seu trabalho no dia seguinte às 08:30 h a.m. depois de ter levado o filho de 8 meses à ama e a filha de 9 anos à Escola...tem aulas até às 16:00H seguidas de reunião de recrutamento até às 19:45h, etc. tem de dar jantar aos filhos e marido, ajudar a mais velha nos deveres da Escola, adormecer os pequenotes, tarefa difícil porque o mais pequeno não dorme, iniciar a preparação do dia seguinte de aulas, isto se o mais pequeno não ter contraído uma virose e ter de o levar às urgências do Hospital - coisa não incomum para quem tem filhos pequenos - a história é baseada numa história real que é bem mais problemática).

Deixo-vos então o texto:


"MUITO IMPORTANTE:

Os professores do Departamento de Línguas e Literaturas, da Escola Secundária D. Maria II, Braga, na sua reunião ordinária de hoje, 5 de Março, abordaram, inevitavelmente, o modelo de avaliação que nos querem impor. Após demorada, participada e viva discussão, os respectivos professores decidiram redigir e aprovar o documento que, de seguida, transcrevo na íntegra:

. Atendendo a que, sem fundamento válido, se fracturou a carreira docente em duas: professores titulares e não titulares;


. Atendendo a que essa fractura se operou com base num processo arbitrário, gerando injustiças inqualificáveis;


.Atendendo a que os parâmetros desse concurso se circunscreveram, aleatória e arbitrariamente, aos últimos sete anos, deitando insanemente para o caixote do lixo carreiras e dedicações de vidas inteiras entregues à profissão;

. Atendendo a que, por via de tão injusto concurso, não se pode admitir, sem ofensa para todos, que seguiram em frente só os melhores, e que ficaram para trás os que eram piores;
. Atendendo a que esse concurso terá repercussões na aplicação do assim chamado modelo de avaliação, já que, em princípio, quem por essa via acedeu a titular será passível de ser nomeado coordenador e, logo, avaliador;

. Atendendo a que, por essa via, pode muito bem acontecer que o avaliador seja menos qualificado que o avaliado;

. Atendendo a que o modelo de avaliação é tecnicamente medíocre;

. Atendendo a que o modelo de avaliação é leviano nos prazos que impõe;

. Atendendo a que o modelo de avaliação contém critérios subjectivos;

. Atendendo a que há divergências jurídicas sérias relativas à legitimidade deste modelo;
. Atendendo a que o Conselho Executivo e os Coordenadores de Departamento foram democraticamente eleitos com base nas funções então definidas para esses órgãos;

. Atendendo a que este processo, a continuar, terá que ser desenvolvido pelos anunciados futuros Conselhos de Escola, Director escolhido por esse Conselho, e pelos Coordenadores nomeados;

. Nós, professores do Departamento de Línguas, da Escola Secundária D. Maria II, não reconhecemos legitimidade democrática a nenhum dos órgãos da escola para darem continuidade a um processo que extravasa as funções para as quais foram eleitos;
. Mais consideram que:

. Por uma questão de dignidade e de solidariedade profissional, devem, esses órgãos, suspender, de imediato, toda e qualquer iniciativa relacionada com a avaliação;

. Caso desejem e insistam na aplicação de tão arbitrário modelo, devem assumir a quebra do vínculo democrático e de confiança entre eles próprios e quem os elegeu, tirando daí as consequências moralmente exigidas.

Notas:
1 – Dos 22 professores presentes, 21 votaram favoravelmente e 1 votou contra:
2 – Para além de darem conhecimento imediato deste documento aos órgãos, ainda democráticos, da escola, os professores decidiram dá-lo a conhecer a todos os colegas da escola;
3 – Decidiram também dar ao documento a maior divulgação pública possível, e enviá-lo directamente para outras escolas e colegas de outras escolas;
4 – Pede-se a todos os professores que nos ajudem na divulgação deste documento, e que o tomem como incentivo e apoio para outras tomadas de posição;
5 – Este documento ficou, obviamente, registado em acta, para que a senhora ministra não continue a dizer que nas escolas está tudo calmo, e que só se protesta na rua;
6 – A introdução e as notas são da minha exclusiva responsabilidade;
7 – Tomo a liberdade de agradecer com prazer aos professores da Escola Secundária D. Maria II, Braga, e principalmente às mulheres, as mais aguerridas, pelas posições firmes que têm assumido, e por rejeitarem qualquer outro lugar que não seja a linha da frente da luta pela dignidade docente. É um orgulho estar entre vós.
António Mota
Escola Secundária D. Maria II, Braga

Março 6, 2008

Sem comentários: